Zonas de desconforto e a ilusão da estabilidade
Tem horas que a gente mete o louco e nem é por escolha
Eu 'tô doente do peito
Eu tô doente do coração
A minha cama já virou leito
Disseram que eu perdi a razão
Eu tô maluco da idéia
Guiando carro na contramão
Saí do palco, fui pra platéia
Saí da sala e fui pro porão
Que Loucura, canção de Sérgio Sampaio,
Sérgio Sampaio é um músico que descobri graça à minha mãe, mãe essa com a qual não me comunico no momento. Cortar relações com uma parte tão próxima da família foi um dos grandes acontecimentos desse ano. Outros foram a mudança de São Paulo para Salvador, da qual já falei bastante aqui, a guinada de carreira desde que deixei de ser especialista em conteúdo audiovisual na Warner Bros Discovery, e a de paz interior.
Sim, em meio a tantas mudanças malucas, eu percebi que estou mais em paz. Há quem diga, de uma forma zen, que abrir mão do controle é a chave da felicidade. Na minha humilde opinião, é um pouco difícil abrir mão de algo que nunca se teve pra valer. É o quase que mata. A proximidade com o sucesso, com a estabilidade, a idade de que dá para garantir algo.
Eu sou de uma geração de de uma origem social nas quais não é comum pensar no sonho americano-burguês-médio. Minha mãe e meu pai já passaram dos 60 e nunca tiveram casa própria de verdade, e isso se fez presente na minha vida. Soando como o Batman em um quadrinho qualquer eu aprendi a esperar o inesperado. E isso não ajuda a ter planos de longo prazo, porque você se prepara para o fim do mundo em pouco tempo, não para tempos de paz.
A solução que tem funcionado para mim é abraçar a loucura. Aceitar que muita coisa não faz sentido ou é linear e que eu devo botar fé no que me centra. Sejam projetos com pouca chance de sucesso (virá aí uma nova revista literária?), trabalhos que não dão resultado imediato, carreiras mais ousadas, relações menos prováveis. A verdade é que pra projetar futuro a gente tem de ser capaz de ter sonhos um pouco luminosos, e o que é o onírico, se não o nosso subconsciente livre de muitas rédeas.
Em 2023 no Brasil não é nada incomum estar doente do peito, da cabeça, das convicções. E é a partir daí que entendemos o mundo, dentro dessa perspectiva dolorida, meio amalucada, perdida. Como diria Jout Jout, tá todo mundo mal. Mas a gente tem de poder se perder, se iludir um pouco. Se alienar um pouco das autocobranças, da culpa por sobreviver, da cobrança de ser um sucesso.
Se reconhecer nos outros nos devaneios, nos desejos pouco possíveis, no que a gente deseja ardentemente e achar acolhimento ajuda. Mas precisamos aprender a nos acolher também. Abrace seu lado maluco, viva alguns enganos, faça coisas apenas porque quer e sente vontade. Nem tudo precisa ser lógico ou racional. Vai lá e pira.
Como diria um grande poeta do skate, somos poucos muitos mas somos muito loucos.
SKATEEEEEE